As últimas Cartas de Santa Scorese

Cartas XXV-XXVII * XXX-XXXI * XXXVI
28 de Agosto de 1989 – 31 Dezembro de 1990

[Traduzido por Regina Célia Pereira Da Silva]

Nota: Texto extraído da publicação oficial de autoria do Prof. Giuseppe Micunco escrito para a Diocese de Bari. A numeração das Cartas segue também esta edição. As palavras e expressões evidenciadas nas cartas correnspondem àquelas que a Santa Scorese tinha evidenciado no seu manuscrito.

Carta XXV * Para Carmencita Picaro * 28 de agosto de 1989

Querida, obrigada, obrigada, obrigada!!!!
O meu coração consegue dizer-te só isto. Parece-me impossível que eu não consiga encontrar-te quando fôr à “Casa” de Bari e por isso não poderei estar contigo.

Estou a experimentar uma grande dor porque gosto de ti, mas principalmente porque tu és uma grande ajuda para mim, o “tesouro” que encontrei o qual quero proteger ciosamente!

Peço-te por favor, faz com que os quilómetros que nos separam não destruam tudo aquilo que construímos!!!
Lembra-te de mim e reza e... fica ao pé de mim sempre que puderes, porque tu sabes que eu tenho uma cabeça dura, mas sou também muito frágil! Bôh! Estou a começar a chorar e é melhor que eu não molhe este postal.

Então somos “um”!!
Abraço-te fortemente,

>      Santa

Carta XXVI * Para Carmencita Picaro *
14 de Novembro de 1989

Sei que é quase ímpossivel perdoar-me, mas tu, perdoas-me?
Finalmente, estou aqui a escrever-te.

Estou na biblioteca da minha faculdade à espera do professor de pedagogia para ver com ele o meu plano de estudos. Espero que ele me ajude!!! Trata-se de uma pessoa muito disponível, portanto ... Não sei por onde começar a falar porque é esquisito estar aqui a contar-te isto, exactamente a ti, que sabes tudo de mim. Não sei se já te disse, mas a minha mente recusa-se a pensar que estás longe e, dever escrever-te faz-me ter consciência desta realidade.
Enfim, ainda não engoli o sapo da tua ida e talvez nunca o consiga engolir.

Nestes últimos tempos sinto muito a tua falta; gostava muito de conversar contigo e ... porque não, termos uma zanga! Na Casa as coisas também mudaram um bocado! A Mariella está a tentar integrar-se no ambiente e eu, bôh! Parece que tenho que manter bem alto o teu bom nome e comportar-me como uma digna filha tua.

A propósito di um encargo que me queriam dar, a Bruna disse-me: “Tens que fazer aquilo que fazia a Carmencita”, “Tu sabes como é que ela fazia e tens que fazer exactamente o mesmo!”.

Depois, no domingo encarregou-me da Missa e até tive que introduzi-la assim como ... fazia a Carmencita. Sei muito bem que não vou conseguir fazer as coisas como tu fazias e parece-me correcto não fazê-las exactamente iguais, mas espero que aquilo que me ensinaste e os teus puxões de orelhas agora sirvam para qualquer coisa.

Ah! Sabes? A uma dada altura durante o dia Carmela Montereale disse-me que por um instante, quando viu os meus cabelos curtíssimos, pareceu-lhe que eu, fosses tu! Imagina só? Queres ver que agora torno-me tua sósia? Será que o meu corte de cabelo é mesmo feio!?!

Deixemo-nos de brincadeiras, estou a tentar adaptar-me ao ambiente de trabalho deste ano. Tenho uma dificuldade: durante as jornadas, é difícil estar “da parte das missionárias” e preferível estar do lado das jovens.
Eu cresci com estas jornadas (principalmente com aquelas da oração!) e agora é difícil viver com um espírito diferente. D. Tonino, diz que isto é pobreza e que tenho que aprender a vivê-la!
Parte da minha pobreza deste tempo é o não conseguir “obedecer” imediatamente a Bruna. Sabes muito bem quais são as minhas dificuldades e não consigo mesmo superar-me!

Estou a dar conta de quanto o meu espírito é livre, ou seja, anárquico e sei que isto não é justo!
Neste tempo sou muito rebelde e consegui “zangar-me” já uma série de vezes com o nosso pároco (que é apenas um mês que está entre nós!).

Ainda não nos conseguimos entender e isto faz-me sofrer um bocado. Acho que ele tem uma ideia errada sobre mim, portanto quando fala está sempre de pé atrás. Ontem à noite chegou mesmo a dizer que quando fala comigo tem que adoptar um filtro!

Bôh! Como vês o Senhor deu-me logo uma pessoa com quem não me entendo e ... o que me pesa é que já tive que lhe pedir desculpa uma vez. Pobre do meu orgulho!!!!

Desde domingo passado que o meu espírito está um pouco melhor! A descrição de D. Tonino sobre a Eucaristia foi mesmo eficaz e assim no encontro pessoal com ele, como já te disse descobrimos que tenho que viver bem a pobreza.

Depois, à noite a Bruna disse-me que tenho que começar a pensar no pedido para o período de formação e, pode-te parecer estranho, fiquei contentíssima porque foi como se Jesus me tivesse pedido mais uma vez de escolhê-Lo, de empenhar-me sériamente com Ele.

E tu perguntas-me: “Escolheste-O? Abriste-lhe a porta do teu coração?”. Nestes dias estou a pensar nisto, mesmo se eu já dei a minha resposta: escolho-O mas principalmente faço-me escolher e amar ainda por Ele, com o coração mais aberto. Exactamente porque me está a incomodar, estou a descobrir que maravilha é o Seu amor!

Na tua carta tinhas-me acusado de ser egoísta. Ainda o sou um pouco, mas o Senhor está a dar-me a capacidade de ver estes aspectos negativos e por isso estou a procurar ultrapassá-los.
Infelizmente descubro que tenho cada vez mais limites, mas como diz S. Paulo, é quando sou fraco que descubro a Sua grandeza.

Portanto, é um período no qual existem altos e baixos, mas apesar de tudo sinto que nunca estou sozinha e vejo que Jesus põe ao pé de mim pessoas que necessitam sempre de qualquer coisa de mim.

Entretanto estou a procurar viver bem a minha vocação em tudo o que faço, nas coisas mais pequenas, porque tudo o que eu faço deve responder a uma única pergunta: “Por quem o fazes?” (são as indicaçõesde D. Tonino e de D. Tino!) . D. Tonino diz que só vivendo agora, aqui, entre as minhas coisas, com este comportmento de oração, de meditação, de audição, de penitência, de abertura aos outros, poderei viver com serenidade a minha entrada na comunidade. A vida de comunidade deve ser uma continuação da minha vida de hoje e não uma realidade diferente.

Estas são as suas indicações, depois veremos. Eu esforço-me por viver numa abertura contínua a Deus e aos irmãos, mas parece-me que os outros colham o positivo mais do que eu própria. Na paróquia alguém intuíu qualquer coisa e outros perguntam-me abertamente se é verdade que sou missionária, outros ainda dizem que tenho”uma vocação”, mas eu procuro evitar estes assuntos.

Outro limite: tenho medo de descobrir muito! É sinal de uma escolha não totalitária? Por agora prefiro que os jovens me considerem uma como eles e que os adultos pensem que sou uma moça ocupada, porque tenho medo que as relações entre nós mudem. Os jovens estão a intuir que existe qualquer coisa de “diferente”, por isso dirigem-se a mim para serem ouvidos, ajudados e os adultos usam-me como pau para toda a colher (do que eu não gosto!).
Não quero ser considerada como uma pessoa “diferente”, mas como uma que fez uma escolha e que procura viver com coerência.
Pensa lá tu? Existe quem com a minha idade esteja ainda a pensar no que há-de fazer na vida e a mim o Senhor revela-me o seu plano dia após dia. Que sorte! Quer dizer, que Graça!
Não sei se estou a responder às tuas perguntas, ao teu desejo de saber, mas estou a escrever-te um pouco daquilo que me passa pela cabeça.

Ah! Esquecia-me. O Giuseppe está a fazer-se presente outra vez. A Bruna disse-me que ele está a telefonar para Bolonha continuamente; falou com a Franca e com a Lúcia e parece que conseguiu ter o número de telefone do D. Marino (o meu pároco). Estou cheia de medo, mas não falei disso aqui em casa. Reza para que eu me livre deste pesadelo!
Não quero continuar a ser acompanhada e agora que recomeçam as lições na universidade gostaria de estar mais livre.

Ficarei aqui durante horas a falar contigo mas já escrevi tanto, portanto deixo o resto do espaço para ti. Conta-me um pouco sobre ti!
Agradeço-te do fundo do coração o postal de parabéns que me mandaste e a lindíssima oração: és única!!

Agradece por mim o resto da comunidade e diz-lhes que as tenho no coração e que tenho no coração ... toda a comunidade (sabe-se lá porque é que tenho estas preferências!!). Quando eu puder escrever-vos-ei para contar a nossa vida em comunidade e as nossas actividades, mas ... tem um pouco de paciência!

Agora só me resta abraçar-te forte, forte e pedir-te que te faças viva de vez em quando.
Um beijão!
Unidas no coração de Maria,
     Santa

P.S. A Rosa está à espera que (tu) lhe escrevas como tinhas prometido. Entretanto a barriga dela está a crescer. Esperemos que seja uma menina!
2) P.S. Sabes que vou a Roma para estar durante uma semana no hospital com a Sandra que vai ser operada ao joelho? Reza!

Carta XXVII *À Directora Geral do Instituto das Missionárias da Imaculada “P. Kolbe” *
8 de Dezembro de 1989

“A minha alma magnífica o Senhor e o meu espírito exulta em Deus meu Salvador porque olhou para a humildade da sua serva ... Grandes coisas fez em mim o Omnipotente!”
O Senhor olhou para a minha pobreza e para ela se inclinou com amor e misericórdia.

Depois de ter ouvido a voz de Jesus que me chama a seguir-Lo, respondi e vivi este período de prova descobrindo dia após dia o Amor de predilecção que ele tem por mim.
Durante este ano tentei descobrir cada vez mais a minha vocação para a vida consagrada, e a minha responsável, com as outras missionárias da comunidade, ajudaram-me a colher os sinais do Senhor que passa.

Depois de me pôr na presença de Jesus e de fazer ecoar no meu coração a Sua proposta, sinto que lhe posso dizer um sim ainda maior, mais totalitário e que, como e com Maria, quero dizer-lhe:”Eis-me, faz de mim aquilo que Tu queres”.

Consagração total a Deus e à Imaculada!
É a resposta para todas as minhas exigências mais profundas, que me ajuda a responder também àquelas dos irmãos.
Ser Maria no mundo: quero que seja este o meu papel, a minha identidade.
Levar Jesus aos outros através de Maria é a função mais bonita que o Pai Bom me quer confiar.

Durante este tempo procurei viver esta tarefa que o Senhor me deu, mas sinto que agora me pede para subir um degrau mais alto. Não preciso de saber em que família consagrada devo viver a minha consagração porque a experiência que vivi durante este ano apaixonou-me muito mais pelo Ideal mariano e missionário.

Gosto do Instituto porque em si contém o segredo que faz viver uma vida autêntica: Maria une a Cristo e Ele faz sentir a urgência pelos irmãos.
Não podia e não poderei pedir dom maior a Jesus do que este de me ter feito encontrar este carisma. A Consagração à Imaculada, modelo perfeito de mulher, é o grande dom que o P. Kolbe me fez e a sua preciosidade, estou a descobri-la, pouco a pouco, quando a vivo: é, para mim, a maneira melhor para poder viver mais unida a Cristo.

Por isso peço para ser admitida ao primeiro ano de formação neste Instituto, para que esse possa ser o meio que me ajuda a realizar a minha vocação, ajudando-me a estar “no mundo, mas não ser do mundo”, com uma identidade exacta e com a alegria de ser membro de uma família que vive em comunhão profunda com Maria e Jesus.

Viver em comunidade é a forma de vida que sinto mais adapta a mim porque caminho para a santidade, mas a minha família não consegue aceitar a minha escolha.

Sempre construí a unidade na minha família e sinto que este não é o momento mais oportuno para criar uma grande fractura: eu queria com a ajuda do Senhor, evitar o pior!
Além disso, nos últimos tempos meditei muito a Palavra de Jesus: “Se quiseres ... deixa tudo” e entendi que agora o Senhor, mais do que deixar materialmente as coisas, pede-me que deixe tudo o que tenho dentro de mim.
Sinto a necessidade de começar, desde já, a fazer a experiência da minha vida de consagração, entre as minhas coisas, mas separada delas, com a minha família, mas com o coração livre para Deus.

Sinto que a minha vida e comunidade deve ser, para mim, a continuação de um estilo de vida que já comecei a assumir, estando ainda em casa, onde, talvez seja mais difícil.
E´exactamente por isso, que peço que me seja concedido ficar ainda em minha casa. Pela minha parte, garato que paraticiparei activamente à vida da comunidade e cumprirei da maneira melhor possível a minha actividade: o estudo universitário.

Entretanto vou procurar abrir cada vez mais o meu coração ao Senhor, que fala, para que nem uma migalha da Sua Graça se desperdice e para que eu possa ser, nas Suas mãos, instrumento para a realização do Reino dos Céus. Agradeço por isso o Instituto, pela sua abertura e disponibilidade e despeço-me, empenhando-me em rezar pelo Padre (1)e por todas as missionárias.
     Santa Scorese

Nota:
1.
1. P. Luigi Faccenda, fundador das “Missionáras da Imaculada – P. Kolbe”.

Carta XXX * Anónimo * 18 de Janeiro de 1990

Parabéns!!!!
Que tu possas cantar hoje o teu Magnificat, por todos os prodígios que o Senhor fez em ti nestes anos!!

Eu aproveito este momento para te agradecer pela tua amizade, pela tua disponibilidade e pela grande paciência que tens em ouvir.
Na realidade, estou a pregustar neste tempo especial (se não outra coisa) o verdadeiro sentido da amizade.

Então, já te disse os meus “obrigados” e não posso dizer-te agora que sou feliz porque tu esistes!!!
Parabéns!
     Santa

Carta XXXI * Para Carmencita Picaro *
21 de Feverero de 1990

Minha querida,
Não sabes quanta alegria me deste quando há poucos minutos, recebi a tua carta!
Pareceu-me que fosse um sinal do amor de Deus que se renova mais uma vez em mim.
Estou a regressar depois de me ter confessado e o sacramento da reconciliação para mim é verdadeiramente óleo que acalma e cura as feridas e imediatamente depois ... a tua carta!

Tu gostarias de receber imediatamente uma resposta à tua carta, ma eu ao contrário tenho um grande desejo de te ver. Imagina que uma destas noites sonhei que nos víamos e que nos abraçavamos chorando e soluçando. Quem sabe ...
Garanto-te que se me falta uma pessoa essa és tu.

Nestes dias aqui, começou a Primavera e portanto as amendoeiras estão em flor, respira-se um ar mais puro e por isso não posso deixar de lembrar-me dos nossos passeios feitos à beira-mar, das conversas e desejo poder fazê-las outra vez, mas não é possível.

Como é que eu estou? Como sempre a minha garganta não está bem e passei uma semana na cama (com a chinesa (2) e depois no primeiro dia que saí torci o calcanhar direito na porta do carro de um amigo meu. Naturalmente era o dia 5 de Fevereiro, por isso no dia 6, dia dos meus anos, eu andava com o calcanhar ligado que tinha um hematoma (e ainda tem) além disso, está inchado e doí-me. Moral da história: tive a perna parada durante três dias porque no C.T.O. engessaram-na e ainda a tenho ligada porque me contínua a doer.
Infelizmente parece que o hematoma está a desaparecer, mas a dor passa muito lentamente.

É terrível a realidade na qual tu vives!! Mas, no fundo estou contente que tu estejas aí, entre esses problemas, porque és um “sinal” para os outros e eu sei que o mundo tem necessidade de “ver”, de “tocar” com mão para acreditar que nem tudo está perdido, que se pode recomeçar!
Sabes muito bem que entre nós, este tipo de problemas, existe em menor número, mas eu também estou a dar conta da pobreza e do mal que existe ao meu redor.

Ás vezes sinto-me incapaz de poder fazer alguma coisa e não te escondo que muitas vezes quero desaparecer e pensar só ás minhas coisas, mas sei que isto não é justo e por isso ... volto para trás procurando viver sempre entre as pessoas, condividindo com eles as alegrias, as dores, aprendendo pelo menos a ouvir.

Exactamente porque sinto que o outro não pode passar ao meu lado como se fosse um objecto decidi fazer um curso de voluntariado de base organizado pela Cáritas de Palo.

É uma coisa que pede sacrifício porque temos que ir duas vezes por semana e cada lição que dura duas horas, mas eu gosto. Gosto porque me está a ajudar a abrir os olhos e o coração a certos problemas, a ver a coisas de um modo diferente, mais científico, mas, ao mesmo tempo, com fins humanitários. As lições são feitas por psicólogos, psiquiatras, operadores que trabalham nas prisões etc. É uma coisa muito interessante!
Descobre-se a fraglidade humana e ao mesmo tempo a incapacidade das instituições, mas acima de tudo triunfa o amor que um homem sente por outro homem: a verdadeira solidariedade vivida em função de Alguém que é maior do que nós.

Perguntas-me o que é que eu decidi.
Bôh! Foi mesmo ontem de manhã que me encontrei com a Bruna e disse-lhe que não peço os outros seis meses.
É uma decisão muito sofrida, avaliada, vista, revista, mas espero que seja, no entanto, a minha resposta de amor ao Deus que é amor.

Pedir outro tempo para alguém queria dizer ver a minha humildade, mas garanto-te que tive que ser mais humilde quando fiz esta escolha em vez de alungar o tempo.
Exactamente porque eu reconheço, com humildade, a minha nulidade dou conta que não conseguiria respeitar aquelas indicações que me dão.
É um dircurso difícil de fazer por escrito e não sei se consigo fazer-me entender.

Neste momento a humildade para mim é reconhecer alguns fracassos e reencontrar-me sozinha diante de Deus pedindo mais uma vez como Francisco “Senhor, o que é que queres que eu faça?” É humildade reconhecer que Deus ainda não se cansou de mim e me ama enquanto eu não sou capaz em sequer de falar-Lhe ou, apesar de tudo de dizer-Lhe o meu obrigado pelo simples facto que existo.

Hoje de manhã dizia eu a D. Tino que me sinto como se tivesse sido triturada por uma varinha mágica. Sei que devo recomeçar ou .. continuar, mas neste momento não consigo ver as coisas claramente.
Uma coisa é certa: sei que não fechei o meu coração a Deus, que não Lhe voltei as costas depois de ter posto as mãos ao arado, mas escolhi, isto é, deixei-me escolher mais uma vez por Ele. Pode parecer incoerente, mas penso que o Senhor neste tempo me está fazendo viver mais a sua presença e a sua paternidade.

Talvez, agora mais do que nunca Ele esteja a conduzir a mnha história, mas não sei para onde.
E agora eu não lhe estou a perguntar para onde me está a levar, porque estou cansada de fazer perguntas Estou a esforçar-me por fazer um acto de fé e deixar que seja Ele a guiar os meus passos.
Sei que a vocação é um grande dom, mas ouvi sempre dizer que se paga com um grande preço, talvez ... este seja o meu.

Sinto muito a solidão neste momento e sinto também que me faltam os pontos de referência, das pessoas com quem existia uma comunhão, a quem perguntar, com quem condividir. Sinto o peso da responsabilidade que o Senhor me dá pedindo-me que eu viva, doada a Ele, sem pertencer a uma família, aprendendo a “ser adulta na fé” (como diz D. Tino).

Tenho medo. Tenho medo de ter nas minhas mãos novamente as rédeas da minha vida e de jogá-la apesar de tudo como eu quero.
Felizmente Jesus ama-me de tal maneira que fez com que eu encontra-se um sacerdote que sabe ajudar-me, guiar-me e condividir comigo os momenos bonitos e aqueles feios, isto sim, é que é um grande dom!

E depois, agora mais do que nunca sinto próxima de mim Maria que é a pedra preciosa que eu descobri nestes anos.
É Ela que me está ajudando, que é mais do que nunca minha Mãe. Sinto que me tem entre os seus braços, mas ao mesmo tempo, é aquela mulher forte que me pede que eu seja coerente e que viva bem a minha vida, momento por momento.
Enfim, é a mulher que eu gostava de ser, mas não sou! Mas peço-Lhe ao menos a graça de ser um pouco como Ela.

Sei no entanto, que Deus está a escrever a minha história e, apesar dos obstáculos que eu lhe ponho, conseguirá realizá-la e sei agora que, mesmo na dor e na escuridão, posso sempre com Maria, cantar-Lhe o meu Magnificat por todas as coisas que Ele fez e continuará a fazer em mim.

E tu não te canses de estar ao pé de mim com a oração e com o pensamento, principalmente neste momento: é um S.O.S.
Espero de todo o coração que a nossa amizade continue e que se fortifique cada vez mais mesmo se já não fazemos parte da mesma família, mas somos filhas de uma Família maior que tem um Pai e uma Mãe que são amor.

Tenho um nó na garganta, mas mais uma vez quero dizer-te obrigada por me teres ajudado a “nascer” ao amor de Deus e a colher os sinais do amor imenso e especial que Jesus nutre por mim.
Apesar de eu ter feito esta escolha tens que saber que escolho Deus e que tu serás sempre a minha “mamã”!!!!!!

Abraço-te forte, forte e não me abandones!
     Santa

P.S. A oração é lindíssima e foi exactamente rezando naquela quinta-feira no seminário aquela oração que decidi fazer esta escolha, assim naquela noite ... pedi ao Pai que “me ajudasse” para não traír por preguiça e por esperteza o meu projecto de vida inspirado no Evangelho.
Vês? O espírito continua a manter-nos unidas!

Esquecia-me que me perguntaste pela Rosa. Tem uma barriga enorme e agora está em maternidade portanto está sempre aqui.
Está muito bem, assim como o menino/a que não faz outra coisa senão mexer-se. Entre o bebé e eu existe uma “correspondência de sentidos amorosos” e, basta que eu apoie a mão na barriga que ele se faz sentir: é o máximo!!!

De cada vez que isso acontece, eu comovo-me porque penso que é o milagre da vida que se renova e fico muito contente!! Deve nascer no fim de abril porque a Rosa acaba o tempo no dia 22 de abril. Sabes que ela também pensa muitas vezes em ti e hoje de manhã sonhou contigo. Disse-me que te vai telefonar logo que possa porque quer ouvir-te ao “vivo”. Além dos episódios que me contas-te e das tuas reflexões ...não me disseste muito mais ...

Nota:
2.
Era assim que designavam epidema gripal típica do inverno de 1989/90.

Carta XXXVI * Para Don Tino Lucariello *
31 de Dezembro de 1990

Caríssimo,
deve parecer-te esquisito que eu te esteja a escrever mas ás vezes é mais fácil para mim falar desta maneira.
E depois ... com tudo o que tens para fazer nestes dias parece-me impossível roubar-te mais do que dez minutos, que hoje já me concedeste.

Estamos no fim do ano e eu estou habituada a fazer um balanço do tempo que passou e gostaria de o ter feito também contigo, para controlar em que ponto é que me encontro, quanto caminhei (se caminhei!).

Acredita, na realidade, eu queria ter-me encontrado contigo porque, apesar dos últimos dias terem sido “eléctricos”, és a pessoa que de certo modo está a conseguir “dominar o meu espírito” que parece que é um bocado livre e libertino.

Não me parece o caso de escrever tudo aquilo que me está passando pela cabeça, mas hoje, depois que eu falei contigo e no momento em que me lamentava de mim mesma por causa de todas as dores, por todas as dificuldades do ano, dei conta que, no fundo, o Senhor mais uma vez fez com que eu não me privasse dos seus dons.

Foi um ano duríssimo cheio de dificuldades, dúvidas, caídelas, recomeçares, desafios com Deus. Tive que recuperar depois de tudo o que aconteceu com o Instituto e não sei se já estou bem, tive que escolher e... não foi pouco!

Mas em todos estes momentos tu estiveste sempre ao pé de mim e sempre pronto a dar-me uma ajuda, aconselhando-me, decidindo comigo aquilo que eu devia fazer e não posso dizer que não tenha sido um dom precioso de Deus.

Em todas as dificuldades e na escuridão que eu passei este ano, tu foste um dos sinais maiores que me fizeram entender que Deus ainda não se cansou de mim e que me falava através de ti. Aprendi a rezar mais e melhor e agora nunca começo a rezar sem invocar primeiro o Espírito Santo.

Muitas vezes fizeste com que eu batesse com a cabeça contra coisas que eu não queria fazer, entender, acolher e mas que me ajudavam a crescer, e sinto que no final de tudo fiz qualquer passo e que talvez o Eterno Pai possa dizer ainda que se “ regozija” em mim (ou menos um pouco).

Agradeço o Pai por aquilo que fazes por mim e ...também por aquilo que és, apesar de às vezes tu me fazeres “chatear”, mas se calhar isto entra sempre nos planos de Deus, para que eu aprenda a aceitar a minha humanidade, a humildade e os limites de quem vive ao meu lado. Obrigada porque para além de seres o meu “papá” espiritual, sabes ser um amigo, obrigada porque ensinaste-me a gostar ainda mais daquele Amigo por excelência e ... a dizer-Lho!!

Bôh! Chega de agradecimentos, isto é não!!!
Agradeçamos juntos o Senhor pelos prodígios que fez em nós durante este ano e peçamos-Lhe que entre nós se crie uma amizade cada vez maior e mais pura.

Ponhámos de lado os nervosismos e os rancores, enchamo-nos de paciência reciprocamente e, como é que se diz? Ano novo, vida nova!!!
Prontos para recomeçar???
Felicidades!!
     Santa

Cartas XV - XXI

E-mail: gesunuovo@yahoo.it

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